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Os megaeventos são justificativas para remoções forçadas?

Por: Piê Garcia (pie@observatoriodefavelas.org.br)

Fotos: Luiz Baltar / Imagens do Povo

Com a explicação de preparar a cidade para os megaeventos de 2014 e 2016, os gestores do Estado vêm praticando ações que impactam de maneira profunda a vida de milhares de pessoas. Nessa lógica, os moradores de favelas e espaços populares, muitas vezes, são diretamente prejudicados.

No dia 8 de janeiro, representantes da prefeitura foram à Favela Metrô-Mangueira demolir as casas que ainda estavam no local. Moradores e manifestantes entraram em conflito com a polícia. Houve uso de spray de pimenta, gás lacrimogênio e bombas de flash. O tipo de conduta da instituição levou a Comissão de Direitos Humanos da OAB e o Ministério Público a se reunir com a prefeitura para averiguar se houve excessos cometidos no caso.

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“A segunda parte, que resistiu no local, morando durante dois anos em condições insalubres.”

Desde 2010, a prefeitura tem realizado remoções no local, essa foi a terceira. Luis Severino, da Pastoral de Favelas, que vem acompanhando e orientando os moradores desde o início, afirmou que todas as pessoas foram cadastradas para receber o aluguel social, e posteriormente, serão transferidas para casas da prefeitura. Porém, a localização dessas residências ainda é desconhecida.

Em maio de 2011, a Relatora da ONU para o direito à moradia adequada, Raquel Rolnik, visitou a Favela Metrô-Mangueira a convite da missão da Plataforma Descha (Direitos Humanos Econômicos Sociais e Culturais) e falou ao Notícias & Análises sobre remoções e sua relação intrínseca com as violações do direito à moradia no Brasil pré-megaeventos.

Na opinião dela, “A primeira violação é a violação do direito à informação”. Essas remoções de favelas em nome das obras dos megaeventos esportivos seguem um padrão, onde o carro-chefe é a proposital falta de diálogo entre o poder público e as comunidades atingidas.

Adriana Britto, defensora pública no período das primeiras remoções, ressaltou, na época, uma série de violações. Disse que não há diálogo entre o Estado e os moradores e que em muitos casos, as pessoas não têm acesso a informações sobre o que vai acontecer, não havendo, portanto, discussão de alternativas.

A defensora não atua mais no Núcleo de Terras e Habitação da Defensoria Pública, mas conta que o desenrolar das negociações foram feitas à base de ameaças, a população sentindo-se coagida e com medo de perder todos os pertences, acabou cedendo à proposta da prefeitura. A primeira oferta foi o “Minha Casa, Minha Vida” em Cosmos, a 70km do local, na Zona Oeste da cidade, para onde alguns moradores aceitaram ir. A segunda parte, que resistiu no local, morando durante dois anos em condições insalubres, foi conduzida para mais perto, nos conjuntos habitacionais Mangueira 1 e 2, como também confirmou Luis Severino, da Pastoral de Favelas. Adriana reafirma que não houve uma posição transparente da prefeitura sobre os projetos e nem foi revelado o motivo das remoções.

Para Raquel Rolnik, houve avanços em função das denúncias de violações, principalmente por causa da organização das comunidades e da visibilidade que essa questão foi conseguindo, não apenas no Brasil, mas também na imprensa internacional, que foi intensificada com as manifestações de junho.

O Brasil, um dos países signatários do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC), ainda não cumpre as normas estabelecidas, mas já conseguiu algumas vitórias. Em Recife, por exemplo, o número de pessoas que seriam atingidas pelas desapropriações diminuiu devido a uma mudança no traçado que poupou algumas comunidades.

No Rio de Janeiro, o valor máximo das compensações mais do que dobrou. E houve um recuo importante na Vila Autódromo, embora a prefeitura ainda esteja pressionando fortemente as pessoas para saírem de lá, segundo Raquel. Ou seja, “aconteceram avanços e ganhos pontuais, contudo, não houve uma mudança estrutural no padrão”.

Os levantes nacionais motivaram um jornal alemão, o Zeit, a agradecer ao país por questionar o legado deixado pela organização desses grandes eventos. Algo que não aconteceu na Alemanha em 2006 nem na África do Sul em 2010.

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“Não houve uma posição transparente da prefeitura sobre os projetos e nem foi revelado o motivo das remoções.”

O Rio de Janeiro tem sido a cidade mais afetada por sediar ambos os eventos, mas outras 11 cidades também estão sendo alvo de uma intervenção urbana arbitrária, o Estado usa de maneira autônoma o território e os recursos, impactando profundamente a vida de milhares de cidadãos, moradores de favelas, principalmente.

As pessoas que deveriam receber uma atenção especial das autoridades, porque não dispõem de recursos para acessar o mercado imobiliário formal, principalmente agora, que os preços estão mais altos devido à especulação imobiliária, são as primeiras a serem expulsas de locais onde viveram grande parte de suas vidas.

Essa violência estatal só poderia ser justificada por um motivo de grande relevância, em que não houvesse uma alternativa e esse tipo de ação fosse inevitável, como garante o artigo 429 da Lei Orgânica Municipal, o que não é o caso. Esses megaeventos se tornaram argumento para todas as arbitrariedades cometidas, fazendo dos mais pobres meros instrumentos desse objetivo.

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