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Audiência pública sobre o extermínio da juventude negra

Audiência pública sobre o extermínio da juventude negra na Alerj
Audiência pública sobre o extermínio da juventude negra na Alerj

Nesta segunda (19), a Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania da Alerj realizou uma audiência pública sobre o papel do Estado e das políticas frente ao extermínio da juventude negra. Presidido pelo deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL), o encontro contou com a presença de representantes da sociedade civil, da Polícia Militar, e de órgãos governamentais como as secretarias estaduais de Segurança, de Assistência Social e Direitos Humanos e de Saúde. A audiência teve como objetivos estabelecer marcos para a redução da letalidade da juventude negra no sistema de metas da Secretaria de Estado de Segurança e garantir a participação democrática no Comitê Gestor do Programa Juventude Viva no Rio.

Freixo abriu a audiência lembrando o caso do pedreiro Amarildo e dos 5.900 desaparecidos, somente este ano, no Rio de Janeiro. O deputado também ressaltou a importância da avaliação de políticas de redução da letalidade. “Hoje, a falta de diagnóstico impede que tenhamos políticas públicas eficazes. Olhando as taxas de homicídio, poderíamos estar tratando aqui do genocídio da juventude negra. Pois se os números da Baixada Fluminense não são de genocídio, não sei como tratar. Este é, atualmente, um dos dramas mais sérios e não pode ser visto como problema exclusivo da Secretaria de Segurança”, disse.

Na ocasião foram apresentados dados sobre violência letal contra jovens negros por Daniel Cerqueira, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) e Raquel Willadino, do Observatório de Favelas. O pesquisador mostrou como, em 30 anos, houve um aumento significativo no número de homicídios, atingindo uma quantidade cada vez maior de jovens, com idades que também foram diminuindo nesse período. “Somente por arma de fogo, nestes 30 anos, a taxa de homicídios cresceu mais de 300%. Estes mortos tem um perfil bem definido: são negros, jovens, com baixa escolaridade — até sete anos de estudo –, morrem mais no verão, nos finais de semana e à noite”.

O pesquisador apontou ainda a baixa qualidade das informações armazenadas nos bancos de dados das áreas de saúde e segurança pública. Com dados colhidos a partir de formulários mal preenchidos, de instrumentos de coleta insuficientes ou sistematizados de forma incompleta, fica mais difícil estabelecer cruzamentos de informações que poderiam ser importantes para entender a realidade. De acordo com Cerqueira há antes disso a descontinuidade das políticas e, em muitos casos, a inexistência de avaliação destas pelo poder público, o que impede que se saiba se essa ou aquela iniciativa está dando certo.

Raquel Willadino, do Observatório de Favelas, mostrou como o cruzamento de diferentes variáveis pode ajudar a compreender melhor aspectos fundamentais para a redução da violência letal entre os grupos mais vulneráveis. Willadino apresentou dados que, embora apontem uma tendência de queda nos homicídios para o conjunto da população brasileira, quando desagregados a partir do recorte de raça e faixa etária indicam queda nos números de assassinatos apenas para jovens brancos. Entre os negros, o número de homicídios aumentou. “Quase 77% dos jovens que perderam a vida em 2010 eram negros. A magnitude dos dados e a não sensibilização da sociedade diante deles, mostram o processo de hierarquização da cidadania e do valor da vida”, analisou. A pesquisadora destacou ainda o fato de que a principal política pública de redução de homicídios de jovens, o Plano Juventude Viva, do Governo Federal, não tem como eixo central a redução da letalidade. “O perfil racial e de gênero das vítimas é nítido. Neste sentido, o foco das políticas públicas pouco tem dialogado com a realidade”, comentou, ao informar que apenas 17% das políticas de redução da violência apresentam ações específicas com recorte de gênero e somente 8%, de raça.

Políticas: falta de conexão com a realidade

Durante a audiência, a fala do superintendente da Subsecretaria de Planejamento e Integração Operacional, o Coronel da PM, Alexandre de Souza, sobre a política das UPPs explicitou a falta de diálogo da política de segurança pública do Governo Estadual com o quadro de letalidade. O Coronel admitiu que esta política não tem recorte de juventude e raça e colocou sua perspectiva sobre a razão do grande número de jovens negros assassinados em relação aos brancos. “Sobre a quantidade de mortes entre pretos e pardos, tenho a impressão de que isso acontece pelo perfil demográfico do estado. É uma representação do perfil demográfico do estado”, sugeriu.

Os dados do Censo 2010 desmentem a impressão do superintendente. Eles mostram que a população do Rio de Janeiro é composta 47,4% por brancos e 51,7% por pretos e pardos. Entre os jovens do sexo masculino, 55,8% são pretos e pardos enquanto 43,3% são brancos. Segundo o Mapa da Violência 2012, no estado, foram 736 homicídios de jovens brancos contra 1899 de negros — quase 2,6 vezes mais negros foram mortos.

Pedro Prata, da Secretaria de Assistência Social e Direitos Humanos, informou que o Governo do Estado aceitou receber o Plano Juventude Viva, mas ainda não recebeu os recursos e, portanto, não está implementando a política. Ele falou ainda sobre os entraves para o desenvolvimento de ações de redução da letalidade que dialoguem com o perfil racial e de gênero das principais vítimas de homicídio no estado. “Há dificuldade para debater a questão da juventude negra no governo, porque temos um programa bem visto internamente, que trouxe resultados estatísticos em relação aos índices”, disse.

Raphael Calazans, do Fórum de Juventudes do Rio de Janeiro, foi enfático sobre a efetividade do Plano Juventude Viva no Rio. “São cinco meses da assinatura do plano, pelo governo do estado e no que avançamos?”, questionou. Além de reivindicar a desmilitarização da polícia, o jovem pediu o fim do que chamou de pena de morte não declarada, o auto de resistência. Calazans também citou o caso de Amarildo: “Não cabe mais perguntar onde está Amarildo. Queremos saber quem o matou”.

O deputado Marcelo Freixo encerrou a audiência sugerindo ao superintendente da Subsecretaria de Planejamento e Integração Operacional que incluísse a identificação racial nas notificações de homicídio. O Coronel Alexandre de Souza informou que as metas e critérios para esse semestre já estão estabelecidos, mas se dispôs a discutir a inserção da identificação racial no próximo. A Secretaria de Assistência Social e Direitos Humanos se comprometeu a agendar uma reunião com representantes da sociedade civil para debater a implementação do Juventude Viva no Rio de Janeiro.

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